Em um tempo em que escolas correm para se adequar à “educação do século XXI”, muitas acabam deixando para trás o que realmente importa. A história da escola de Dona Marlene mostra como a pressão por resultados e a influência de consultorias externas podem esvaziar o sentido da educação. Neste artigo, você vai conhecer um retrato real e simbólico do que tem acontecido com muitas instituições educacionais no Brasil.
A era dourada da escola de Dona Marlene
Fundada há mais de 40 anos, a escola de Dona Marlene foi referência nos anos 80 e 90. Baseava-se em uma pedagogia humanista, preocupada com o desenvolvimento integral dos alunos — acadêmico, emocional, social e até espiritual.
Com uma equipe de professores apaixonados, a escola formou artistas, cientistas e cidadãos conscientes. Dona Marlene era mais do que uma diretora — era uma figura maternal que inspirava todos à sua volta.
A crise: perda de matrículas e o peso da concorrência
A partir dos anos 2000, a escola começou a perder alunos. Redes de ensino privadas e sistemas apostilados ganhavam força, oferecendo uma proposta focada em resultados mensuráveis e vestibulares. Dona Marlene sentia que seu projeto educacional estava ficando para trás.
Pais, preocupados com o desempenho acadêmico dos filhos, começaram a migrar para escolas que ofereciam “preparo real para o mercado”.
A entrada da “inovação” e a chegada do consultor
Para reverter o cenário, Dona Marlene contratou Jorge Paulo, um consultor em edu-business com histórico em startups e fundações privadas ligadas ao setor empresarial. Sem formação em educação, ele prometia modernizar a escola com tecnologia, dados e eficiência.
Palavras como “disrupção”, “metas” e “indicadores de desempenho” passaram a fazer parte do cotidiano escolar.
A transformação: do humanismo à produtividade
Com a nova gestão, vieram grandes mudanças:
- Parceria com sistemas apostilados e plataformas digitais;
- Demissão de 70% dos professores;
- Redução de custos com arte, projetos e atividades extracurriculares;
- Aumento de alunos por turma;
- Implementação de um “Big Brother escolar”, que media tudo: presença, notas, produtividade docente e rendimento dos alunos.
As aulas foram padronizadas e centradas em listas de exercícios e simulados. Os professores passaram a ser avaliados por métricas rígidas. Alunos com baixo desempenho eram convocados para reforço ou convidados a “refletir” se aquele era o melhor lugar para eles.
O marketing da escola moderna
Para o público, a escola passou a vender-se como uma instituição inovadora, com metodologias ativas, personalização do ensino e foco em aprovações. Na prática, tornava-se uma linha de montagem educacional, segundo relatos de alunos e pais antigos.
As consequências: o que ficou para trás
Embora tenha atraído novos alunos com sua propaganda agressiva, a escola perdeu muitos dos antigos. Termos como “fábrica de moer gente” passaram a circular entre os ex-alunos.
Casos de burnout, ansiedade e depressão começaram a surgir, ignorados pela direção. Os valores que sustentaram a escola por décadas foram abandonados em nome da “eficiência”.
O fim da ilusão e o esvaziamento do sentido da escola
Jorge Paulo, agora famoso, seguiu em frente com novos projetos — inclusive para o setor público. Já Dona Marlene permaneceu à frente da escola, mas sem reconhecer mais o que havia criado.
“Já não sabia mais se era bem sua. Já não sabia mais se era escola.”
A promessa de modernização não trouxe os resultados esperados. A essência da educação foi perdida no processo.
Reflexão final: o preço da inovação sem alma
A história da escola de Dona Marlene é um alerta para educadores, gestores e famílias. Em nome da “educação do futuro”, muitas escolas estão abrindo mão do que é essencial: o vínculo humano, o pensamento crítico, o tempo de aprender.
Mais do que resultados em rankings, a educação precisa formar pessoas.
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